sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Escola Alternativa - Reflexões acerca do currículo escolar.



Currículo Escolar: algumas    reflexões 



“... As disputas pelo currículo – sobre quais experiências serão representadas como válidas ou qual língua ou história será ensinada – são inquestionavelmente permanentes.” (Michel W. Apple*)

Muito embora a escola como instituição seja um produto da era moderna, ela nem sempre teve a mesma estrutura que conhecemos hoje. A primeira ideia de currículo, no sentido de organizar a experiência escolar de um grupo de alunos em um documento, data do século 17; no entanto, o "currículo", como o entendemos hoje é uma invenção formatada apenas no século 20. Elizabeth Macedo, professora de currículo do programa de pós-graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e uma das autoras do livro recém-lançado Teorias de currículo, descreve e analisa esse período e seus principais marcos históricos que fizeram do currículo brasileiro o que ele é hoje.

Segundo ela, para muitos autores a concepção sobre a necessidade de decidir o que ensinar no Brasil foi impulsionada pela industrialização americana no início do século 20 e, mais fortemente, pelo movimento da Escola Nova na década de 1920. Isso porque o desenvolvimento industrial e urbano trouxe a demanda de que a educação formasse pessoas adaptadas para trabalhar nesse novo mundo. Surge o questionamento: se os conhecimentos na escola precisam ter uma utilidade para os alunos, o que precisa ser ensinado? "Os escola-novistas trouxeram essa questão do aprender a aprender, pensando na escola, em vez de centrada no conteúdo, focada no processo de aprendizagem. Isso era uma grande luta entre a ideia anterior, de que eu precisava ensinar coisas para a criança virar adulta, e a nova, de que estou ensinando uma criança e o processo de ensinar é lidar com o dia a dia desse sujeito", explica Elizabeth.


Campo de disputas

Essa luta permanece até a década de 1950, sempre tendendo para a convicção de que a escola precisa formar um tipo de indivíduo bem definido, e que uma educação eficiente se traduz em conseguir prever que tipo de formação os jovens vão ter. A partir desse momento, com o fortalecimento do Inep - hoje Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, à época Instituto Nacional de Pedagogia - foram trazidas teorias e experiências americanas por meio de uma série de campanhas e parcerias, especialmente no campo da matemática e das ciências. Chega ao Brasil a teoria de Ralph Tyler, que une o eficientismo social de Franklin Bobbitt e o progressivismo de John Dewey, e que perduraria por cerca de 20 anos no país. Ela consiste em um procedimento de quatro etapas, conforme detalha o livro Teorias do Currículo: definição de objetivos de ensino, seleção e criação de experiências de aprendizagem apropriadas, organização dessas experiências de modo a garantir maior eficiência ao processo de ensino, e avaliação do currículo. De acordo com as autoras, o que une essas três teorias é a prescrição curricular: "Em todas elas, é enfatizado o caráter prescritivo do currículo, visto como um planejamento das atividades da escola realizado segundo critérios objetivos e científicos".

Nos anos 70, em pleno regime militar, o Brasil centrou sua educação em modelos americanos basicamente técnicos, conforme descreve Elizabeth. Isso significa definir metas e, a partir dessas metas, tentar estabelecer processos mais eficientes para alcançá-las. "Esse modelo foi importado no mundo inteiro, e passamos a viver da prescrição americana. Tínhamos laboratórios de currículo que trabalhavam nos estados e municípios para definir um currículo e fazer treinamento de professores para implementá-lo", conta.

A redemocratização na década de 80 trouxe a influência do pensamento marxista e se traduziu em duas correntes no campo do currículo: os "conteudistas", com a "Pedagogia Histórico-Crítica" de Demerval Saviani, e Paulo Freire, com a preocupação "culturalista". Os primeiros regeram um amplo processo de renovação curricular nos estados e municípios, muitos deles vigentes ainda hoje, com o princípio da responsabilidade da escola como promotora do crescimento do indivíduo por meio das interações sociais e da quebra da reprodução de conteúdos que serviam apenas às classes dominantes e à manutenção das desigualdades sociais. Em outro paralelo, na linha de Paulo Freire defendia-se que a educação não consistia em substituir os saberes dos alunos por novos considerados mais úteis e importantes, mas em levar em conta o conhecimento e a experiência dos jovens no processo de aprendizagem. "O currículo de São Paulo de 1989, implementado por Paulo Freire, é um exemplo dessa perspectiva, com a ideia de não fazer um guia curricular, mas de trabalhar com as redes nesse processo de produção conjunto", afirma.

Novas perspectivas

Apenas em 1996, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), aconteceu a primeira tentativa de definir diretrizes curriculares no Brasil. Esse documento foi relativamente genérico, já que trazia poucas especificidades, e acabou sendo incorporado apenas parcialmente por estados e municípios. Na mesma época, em 1997, foram publicados os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), mais detalhados, porém não reconhecidos oficialmente pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) como currículo nacional e, por isso, não obrigatório. Assim como a LDB, os PCNs assumiram o papel de orientadores curriculares. É importante ressaltar que nenhuma das teorias de currículo, mesmo as da virada do século 19 para o 20, morreram completamente, e partes, mesmo que mínimas, de seu pensamento e/ou técnica foram remontadas no que conhecemos hoje por currículo. As novas diretrizes curriculares, aprovadas entre 2009 e 2011, atualizam a LDB e os PCNs e são compulsórias a todas as escolas e redes do país. Como já foi apontado, até o fim de 2012 o Ministério da Educação (MEC) promete complementar essas diretrizes com uma série de expectativas de aprendizagem.


Fonte

Teorias de currículo, de Alice Casimiro Lopes e Elizabeth Macedo. Cortez.
 

 




Escola Alternativa - Currículo real, oculto e prescrito.



Basicamente, o currículo é uma lista de tudo aquilo que uma escola pretende ensinar. Pode também conter informações mais precisas sobre como e quando vai fazê-lo e também sobre os processos de avaliação das aprendizagens. Geralmente, resume-se a uma relação de matérias, cada uma com seus conteúdos, apresentados na sequência na qual devem ser trabalhados com os alunos de cada série.


     Os currículos evoluem ao longo do tempo e podem sofrer muitas alterações no espaço de algumas gerações. Matérias podem desaparecer, como o Latim. Outras podem ser criadas, como a famigerada Educação Moral e Cívica, nos anos da ditadura, ou a Educação Ambiental, mais recentemente. Novos conteúdos podem ser incorporados, seja por causa de evoluções da ciência acadêmica (como no caso do DNA em Biologia ou da teoria do Big-Bang em Ciências), seja por vontade de reformular os métodos de ensino (como no caso da fracassada experiência com a Matemática Moderna na escola fundamental ou do bem-sucedido uso da literatura infantil na aprendizagem da linguagem escrita).


O currículo pode ser uma referência sobre o modo de ser da escola, especialmente quando apresenta inovações em seus conteúdos. Atualmente, essas inovações podem ser divididas em duas grandes categorias:

1 - Enriquecimento da lista básica de conteúdos ofertados: artes, música, informática, entre outras novas áreas, e conteúdos multidisciplinares (como ecologia, educação sexual, ética, etc.) podem começar a ser incluídos na lista do que a escola pretende oferecer aos alunos.

 


2 - Simplificação de conteúdos ("núcleo básico" ou "tronco comum") e tentativa de criar um "currículo vivo". Essa mudança vem da percepção de que, mais do que trabalhar conteúdos específicos, o importante na educação fundamental é adquirir algumas habilidades e competências básicas, como dominar a linguagem escrita e a linguagem matemática, etc. Diferentes conteúdos e situações podem ser aproveitados para desenvolver essas competências básicas. Conversar com alunos de outra escola, via Internet, é um exemplo de uma situação que pode surgir durante o ano e servir como excelente ponto de partida para trabalhar a linguagem escrita (produção de textos, revisão gramatical e ortográfica) ou os conhecimentos geográficos (como é o lugar onde vive a pessoa com quem estamos nos correspondendo?).

            Outro conceito importante é o de "currículo oculto", que inclui diversos valores (por exemplo: religião, preconceitos de cor e de classe, regras de comportamento, etc.) que a escola pode ensinar, mesmo sem mencioná-los em seu currículo.

Há também o currículo prescrito, que pode ser definido como um conjunto de decisões normativas que são produzidas nos gabinetes das secretarias federais, estaduais e municipais de educação. É um currículo totalmente distanciado do currículo real, pois não respeita a diversidade, e não é construído pelos que fazem a escola cotidianamente. 

O currículo prescrito atribui à escola o papel de transmitir uma cultura com base na lógica da reprodução, um currículo igual para todo o território e para todos os alunos, construído para que o professor o execute da forma como veio estruturado.

       
Mesmo o currículo sendo prescrito, o professor através de sua interação deve construir, no dia-a-dia, novas alternativas curriculares para a sua prática docente.

        
Nos dias de hoje ainda temos escolas quem pensam que todos têm que ser iguais, onde a instituição escolar sempre se organizou a partir dos padrões a serem cumpridos por todos, com práticas de que a aprendizagem acontece no mesmo ritmo e no mesmo tempo, excluindo assim, aqueles que fogem a esse padrão, com classificações e seleções baseadas no modelo tradicional.

 A escola se diz inclusiva, mais continua tratando os alunos que são por natureza diferentes uns do outros, como se todos fossem iguais, excluem aqueles que não se encaixam nos grupos sociais e culturais que a cultura escolar impõe. 

 Há diversos mecanismos que reforçam as desigualdades socioculturais nos sistemas educacionais, um desses mecanismos é o livro didático

Assim como o currículo prescrito que vem pronto para o professor executar, o livro didático também é assim. O professor precisa ver o livro didático como um apoio um norte e não algo que o torne refém dele.
  
O professor deve usar o livro didático como um recurso que irá auxiliá-lo em sua prática, proporcionando uma pedagogia emancipatória, de superação de uma cultura escolar excludente e de um pensar que passa pelo projeto curricular da escola.

Em boa parte dos casos, é preciso reconhecer: a simples leitura do currículo não é suficiente para dar uma ideia de como funciona uma escola. Afinal de contas, existem grandes diferenças entre o currículo oficial e o que efetivamente se passa em sala de aula, que podemos chamar de "currículo real".

           O professor deve usar o livro didático como um recurso que irá auxiliá-lo em sua prática, proporcionando uma pedagogia emancipatória, de superação de uma cultura escolar excludente e de um pensar que passa pelo projeto curricular da escola.

 Em boa parte dos casos, é preciso reconhecer: a simples leitura do currículo não é suficiente para dar uma ideia de como funciona uma escola. Afinal de contas, existem grandes diferenças entre o currículo oficial e o que efetivamente se passa em sala de aula, que podemos chamar de "currículo real".





Fonte:

GIMENO SACRISTÁN, J. O currículo: uma reflexão sobre a prática. 3.ed. Porto Alegre: Artemed, 2000.